Quando interromper a vida?



Eu sempre quis morrer, nunca quis existir, pelo menos enquanto existo.
Principalmente porque não entendo bem o existir.
Penso em morrer a todo o momento. Não pratico suicídio porque a minha mãe disse que é crime (ela era muito simples).
Ela falava que queria morrer também. Mas não me falou abertamente que não queria viver quando estava grávida de mim. E, também não me disse que pensava em interrupção de gravidez por causa dos maus tratos e do trabalho. (Meu pai era ruim). Ela gadanhava alfafa, rastelava e fazia fardo.  
Que coisa incrível? Eu não tinha vontade de morrer naquelas quarenta semanas, estava tão bem naquele dilúvio.  Veio a estiagem e mesmo assim, muitas vezes lambuzado de fezes, não tinha vontade de morrer.
A minha mãe continuou a trabalhar na roça de luzerna forrageira.
Entendi! Eu ainda não era cônscio da minha existência naqueles dias, porquanto não me passava pela cabeça o tal querer morrer.
Depois de alguns anos comecei compreender as palavras que, se realizadas, a minha existência teria outro rumo.
Palavras como: morte, suicídio, infanticídio e, por último, ABORTO E DIREITOS REPRODUTIVOS DA MULHER.
Quarenta e nove anos e nove meses minha mãe me aguentou, depois morreu!

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